Um Passo Para Imortalidade

Luiz Roberto Da Costa Júnior



William Norwood Potter (1840-1895) estava jogando partidas onde dava vantagem (games with odds) contra um jogador amador chamado Richard Fenton (1837-1916), em Londres, em 1875, quando uma das partidas chegou à posição do diagrama na qual Fenton estava ganho.


A partida continuou com 1.Txh3 Rxh3 2.Rc6 Txa5 3.b7


Neste ponto Potter ofereceu empate e Fenton aceitou. Provavelmente Fenton pensou que após 3...Ta6+ seguiria 4.Rb5 Ta1 com empate. A história mais comum é que Potter mostrou o plano ganhador para Fenton após a partida. Outras fontes dizem que foi Zukertort que encontrou o plano ganhador e escreveu um artigo para The City of London Chess Magazine (cujo editor era o próprio Potter durante a existência da revista nos anos 1874-1876). Zukertort indicou o caminho correto para a vitória: 3...Ta6+ 4.Rc5! Ta5+ 5.Rc4 Ta4+ 6.Rc3 (ou 6. Rb3 Ta1 7. Rb2 +-) 6...Ta3+ 7.Rb2 +-. As brancas coroam dama e ganham o final contra torre (cujo método ganhador já havia sido demonstrado no estudo de Josef Kling e Bernhard Horwitz publicado no The Chess Player de Setembro de 1853).

Nesta época Potter era um forte jogador e ajudou Steinitz na equipe de Londres no match por correspondência contra Viena, cuja equipe era liderada por Kolisch. O match Londres – Viena (1872-1874) terminou com a vitória de Londres (1,5 a 0,5) que ganhou o prêmio de 100 libras esterlinas. Vale ressaltar que o empate de pretas foi aceito numa posição tecnicamente ganha e reflete o cavalheirismo da época, além do fato de que não era necessário continuar a partida já que o prêmio estava ganho com a vitória de brancas.

No mesmo ano da partida acima contra Fenton, Potter enfrentou Zukertort num disputado match e perdeu por 6 a 8 (+2 =8 -4). Pouco mais de uma década depois, Zukertort viria a disputar o título de campeão do mundo contra Steinitz, em 1886, nos Estados Unidos (New York, St. Louis e New Orleans) que terminou com a vitória de Steinitz por 12,5 a 7,5 (+10=5-5).

A partida acima passou duas décadas esquecida até que William Norwood Potter faleceu em 13 de março de 1895. Ao se interar do ocorrido, o poeta e professor de francês G. E. Barbier, diretor da coluna semanal de xadrez (aos sábados) no jornal escocês Weekly Citizen, em Glasgow, escreveu um obituário sobre Potter. Barbier que vivera em Londres, em 1875, tentou recordar de memória a partida (não se sabe se viu a partida pessoalmente ou se leu o artigo de Zukertort) e escreveu, posteriormente, uma coluna em 27 de abril dando a posição do diagrama, a seguir, mas que equivocadamente não era precisamente a ocorrida na partida.



Na coluna de 4 de maio, Barbier indicou a solução: 1...Td6+ 2.Rb5 Td5+ 3.Rb4 Td4+ 4.Rb3 (ou 4.Rc3 Td1 5.Rc2+-) 4...Td3+ 5.Rc2+-. Ele indicou que Potter mostrara a variante para Fenton, que era a mesma técnica de ganho indicada por Zukertort em seu artigo (descer o rei até a segunda fila para impedir o ataque de torre por trás contra o peão).

Nesta mesma coluna de 4 de maio, graças ao equívoco de posicionamento das peças na coluna anterior, Barbier continuou investigando a posição e sugeriu, em novo diagrama, que as pretas conseguiriam empatar a posição com o rei em a1.


Barbier indicou a seguinte solução na coluna de 11 de maio: 1…Td6+ 2.Rb5 Td5+ 3.Rb4 Td4+ 4.Rb3 Td3+ 5.Rc2 Td4 6.c8D Tc4+! 7.Dxc4 com empate, pois o rei preto está afogado.

O padre espanhol Fernando Saavedra (1849-1922) da Ordem Passionista (fundada por São Paulo da Cruz no século XVIII) vivia em Glasgow nesta época. Saavedra resolveu o estudo entre os dias 4 e 11 de maio e viu a solução dada por Barbier. Continuou a estudar a posição por alguns dias, compareceu no Clube de Xadrez de Glasgow, encontrou Barbier e comunicou-lhe um achado sensacional. Barbier escreveu na coluna de 18 maio que Saavedra encontrara uma vitória para as brancas, publicou novamente o diagrama e deu a solução final em 25 de maio: 6.c8T! Ta4 7.Rb3+-

A moderna forma que se vê o final foi dada por Emanuel Lasker (no The Brooklyn Daily Eagle de 1º de Junho de 1902, p. 53) movendo-se o peão de c7 para c6 e estipulando que as brancas jogam e ganham. Um dos finais mais famosos e divulgados na história no xadrez com underpromotion. Um lance para a Imortalidade.

Saavedra 
 

Jogam brancas e ganham

1.c7 Td6+ 2.Rb5 Td5+ 3.Rb4 Td4+ 4.Rb3 Td3+ 5.Rc2 Td4 6.c8T! Ta4 7.Rb3+-

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